O usufruto é regulado pela lei civil conforme disciplinado nos artigos 1.390 a 1.411 do Código Civil.  

O usufruto pode ser classificado como direito real e é conferido pelo proprietário da coisa chamado de nu-proprietário a um terceiro, temporariamente, para que dela retire os frutos e utilidades, sem que seja alterada a sua substância. 

Instituído o usufruto, o proprietário defere a posse direta da coisa a um terceiro, chamada usufrutuário.  Esse, passa a desfrutar, a explorar a coisa. Portanto, o usufruto não é uma restrição à propriedade. Trata-se de uma restrição tão somente da posse direta.

Portanto, ao nu-proprietário é assegurado o direito de dispor da coisa e ao usufrutuário é assegurado o direito de explorá-la economicamente.

Cabe o usufruto às coisas móveis, imóveis ou sobre um patrimônio e o usufrutuário pode ser pessoa física ou jurídica. Para os casos de usufrutuário pessoa jurídica, o Código Civil em seu artigo 1.410, inciso III, estipulou um prazo máximo de 30 anos contado a partir da data de início do seu exercício.

Aqui, trataremos do usufruto de ações de sociedade, uma vez que ele tem sido bastante utilizado em planejamento sucessório. Nesses casos o titular cede a nua-propriedade ao seu sucessor, mas reserva para si o usufruto. É preciso ser ressaltado que o tema é complexo e não é regulado, especificamente, em nossa legislação.

Dúvidas: A quem se aplicam os efeitos tributários? (i) constituído o usufruto, há isenção tributária dos dividendos produzidos pelas ações: (ii) e quanto aos juros sobre capital próprio?

  1. COMO A LEI 6.404/76 ENXERGA O USUFRUTUÁRIO 

De forma esparsa a Lei 6.404/76 disciplina a matéria nos artigos 40; 100, inciso I, alínea f; artigo 171, §5º e artigo 205.

Art. 205. A companhia pagará o dividendo de ações nominativas à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária da ação.

Analisando todos os artigos acima, podemos concluir que o destinatário dos frutos no usufruto é o usufrutuário. E a lei civil também disciplina dessa mesma forma. Por tudo isso, o rendimento pertencendo ao usufrutuário deve ser a ele, pago ou creditado.

Os frutos das ações seriam os juros e os dividendos produzidos por elas e a tributação sobre esses rendimentos devem ser suportados pelo usufrutuário, uma vez que, o nu-proprietário não aufere nem juros e nem dividendos. 

A corroborar esse entendimento podemos destacar o artigo 1.403, inciso II do Código Civil que estabelece:

Art. 1.403. Incumbem ao usufrutuário:

II – a prestação e os tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa usufruída.

E, considerando que no âmbito tributário não existe previsão para usufruto de ações de sociedade, devem prevalecer nesses casos os institutos do direito privado, conforme determina o Código Tributário Nacional em seu artigo 109, a saber:

Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.

A Lei 9.249/95 que alterou a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre lucro líquido, previu que a partir de janeiro de 1996 (art. 10), os valores de lucros distribuídos e dividendos incidentes sobre os resultados apurados pagos ou creditados às pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real, presumido ou arbitrado, não ficariam mais sujeitos ao imposto sobre a renda do beneficiário. 

Portanto, todos os lucros e dividendos calculados a partir dos lucros alcançados pela sociedade, não constituem rendimentos tributáveis.

Em regra, a distribuição dos lucros e dividendos é feita aos sócios ou acionistas. Todavia, instituído o usufruto de ações, o destinatário é o usufrutuário.

A Coordenação Geral de Tributação emitiu a Solução de Consulta n.º 38, em 27/03/2018 cuja ementa é transcrita abaixo:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ

EMENTA: USUFRUTO (sic) DE AÇÕES. DIVIDENDOS. TRIBUTAÇÃO. 

Os lucros ou dividendos pagos ao usufrutuário das ações da empresa constituem rendimento não sujeito à tributação pelo imposto de renda, desde que tenham sido calculados com base em resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996. Dispositivos Legais: Lei n.º 6.404 de 1976, arts. 40 e 116; Lei n.º 10.406 de 2002, arts. 1.390 a 1.411; Lei n.º 9.249, de 1995, art. 10. 

Portanto, restou claro que os lucros e dividendos recebidos pelo usufrutuário estão isentos de tributação desde janeiro de 1996. 

Em relação aos juros e dividendos sobre capital próprio a Receita Federal ainda não pacificou o tema.

Essa matéria está regulada pela Lei n.º 9.249/95 em seu artigo 9º. Vejamos:

Art. 9º A pessoa jurídica poderá reduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualmente, a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP.

(…)

§2º Os juros ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de quinze por cento, na data do pagamento ou crédito ao beneficiário.

§3º O imposto retido na fonte será considerado:

I – antecipação do devido na declaração de rendimentos, no caso de beneficiário pessoa jurídica tributada com base no lucro real;

II – tributação definitiva, no caso do beneficiário pessoa física ou pessoa jurídica não tributada com base no lucro real inclusive isenta (…).

 A Receita Federal tem entendido que uma convenção particular de modificação do sujeito passivo, não pode ser imposta a ela. E mais, a Lei n.º 9.249/1995 em seu artigo 9º é interpretada pela fiscalização literalmente, ou seja, reconhecendo a dedução dos juros pagos ou creditados somente aos sócios ou acionistas, não se estendendo aos usufrutuários.

Esmiuçando agora essa situação. A Receita Federal tem considerado que a sociedade paga juros sobre o capital próprio ao nu-proprietário e ele repassa ao usufrutuário, a outro título. Dessa forma, a Receita tributa o nu-proprietário, que nada recebeu, considerando que houve omissão de rendimentos auferidos, e, tributa o usufrutuário segundo o regime próprio das pessoas físicas ou jurídicas.  

Isto posto, o usufrutuário deve sofrer a retenção na fonte à alíquota de 15% e o nu-proprietário, apura o imposto ou poderá ser tributado pela fiscalização por omissão de receita. Absurdo. Mas é assim que está sendo tratado.

Por contrato, pode o proprietário, transferir a terceiro o direito de usar e fruir de suas ações de sociedade, mediante remuneração, possibilitando ao usufrutuário receber os juros e dividendos durante a vigência do contrato.

Por este instrumento caberá ao proprietário a remuneração conforme prevista no contrato e caberá ao usufrutuário os frutos que as ações venham a produzir.

Como não existe previsão legal para as receitas provenientes desse contrato, o proprietário, a nosso entender, deve considerar referida receita como ingresso que deve compor a sua renda, como riqueza nova.

Observando o princípio contábil da competência e de acordo com a Lei n.º 6.404/1976, especificamente em o seu artigo 187, §1º é preciso:

§1º Na determinação do resultado do exercício serão computados:

  1. as receitas e os rendimentos ganhos no período, independentemente da sua realização em moeda; e
  2. os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, correspondentes a essas receitas e rendimentos.

Superadas as situações acima que alcançam o nu-proprietário e o usufrutuário, podemos concluir que ao nu-proprietário, havendo ingresso apto a compor a sua renda, cabe observar e apurar o resultado obtido segundo o regime de competência, e, ao usufrutuário, cabe suportar o ônus incidente sobre os tributos advindos do usufruto.

Junho/2022