O novo Código Civil em seu artigo 1.496, ao tratar da hipoteca, dispõe que “Se tiver dúvida sobre a legalidade do registro requerido, o oficial fará, ainda assim, a prenotação do pedido. Se a dúvida, dentro de 90 (noventa) dias for julgada improcedente, o registro efetuar-se-á,, com o mesmo número que teria na data da prenotação; no caso contrário, cancelada esta, receberá o registro o número correspondente à data em que se tonar a requerer.”A dúvida pode ser entendida como o pedido feito pelo oficial ao juiz competente a requerimento do interessado, para que seja obtida uma decisão sobre a legitimidade de exigência feita pelo próprio oficial, como condição de registro do título.A dúvida tem natureza administrativa segundo o que dispõe a Lei n.º 6.015/1973 em seu artigo 12, a saber:

Art. 12. Nenhuma exigência fiscal, ou dívida, obstará a apresentação de um título e o seu lançamento do Protocolo com o respectivo número de ordem, nos casos em que da precedência decorra prioridade de direitos para o apresentante.

Parágrafo único. Independem de apontamento no Protocolo os títulos apresentados apenas para exame e cálculo dos respectivos emolumentos.

Pelos princípios de que os títulos precisam preencher os requisitos de formalidade e legalidade, cabe ao oficial proceder a esta análise e fazer as exigências que entender necessárias.

A priori, o cartório recebe o título com a presunção de regularidade. Mas é comum a devolução por falhas das mais variadas e elas são apontadas assim que passam pelo crivo dos escreventes especializados.

Portanto, encontrando alguma não conformidade, o escrevente formulará uma nota devolutiva por escrito, com fundamentação, indicando as exigências legais inobservadas e se possível com orientação ao interessado de como proceder para alcançar o seu intento.

Recebida a nota devolutiva, o interessado poderá tomar dois caminhos: i) poderá cumprir todas as exigências feitas pelo escrevente, ou ii) poderá requerer a suscitação de dúvida.

A dúvida deve ser processada nos termos do artigo 198 da Lei dos Registros Públicos, a saber:

Art. 198 – Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimí-la, obedecendo-se ao seguinte: (Renumerado do art 198 a 201 “caput” com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

I – no Protocolo, anotará o oficial, à margem da prenotação, a ocorrência da dúvida;

Il – após certificar, no título, a prenotação e a suscitação da dúvida, rubricará o oficial todas as suas folhas;

III – em seguida, o oficial dará ciência dos termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para impugná-la, perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias;

IV – certificado o cumprimento do disposto no item anterior, remeter-se-ão ao juízo competente, mediante carga, as razões da dúvida, acompanhadas do título.

Dessa forma, pode o interessado impugnar no prazo de 15 dias a dúvida, juntando os documentos que entender pertinentes. Tal impugnação deverá ser encaminhada pelo juiz ao órgão do Ministério Público que em 10 dias juntará a sua manifestação. Após o juiz proferirá a sentença, se não forem requeridas diligências.

Portanto, acolhida a dúvida o registro não será feito. Caso contrário, a sentença determinará a realização do ato registral nos termos do artigo 203, II da Lei n.º 6015/73. No entanto, caso não haja impugnação, ainda assim, deverá a dúvida ser julgada por sentença, que entendemos, ter natureza declaratória.

Além do interessado, o terceiro prejudicado também poderá intervir no processo, segundo autorização expressa contida no artigo 202 da referida lei, que assim prevê:

Art. 202. Da sentença, poderão interpor apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado.

Para facilitar o estudo ora proposto, colaciona-se abaixo os demais artigos da Lei de Registro Público que tratam do tema. São eles:

Art. 203. Transitada em julgado a decisão da dúvida, proceder‑se‑á do seguinte modo:

I – se for julgada procedente, os documentos serão restituídos à parte independentemente de traslado, dando‑se ciência da decisão ao oficial, para que a consigne no protocolo e cancele a prenotação;

II – se for julgada improcedente o interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do protocolo.

Art. 204. A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente.

Art. 205. Cessarão automaticamente os efeitos da prenotação se, decorridos trinta dias do seu lançamento no protocolo, o título não tiver sido registrado por omissão do interessado em atender às exigências legais.

Parágrafo único. Nos procedimentos de regularização fundiária de interesse social, os efeitos da prenotação cessarão decorridos sessenta dias de seu lançamento no protocolo.

c Parágrafo único acrescido pela MP no 514, de 1o-12-2010, que até o encerramento desta edição não havia sido convertida em Lei.

Art. 206. Se o documento, uma vez prenotado, não puder ser registrado ou o apresentante desistir de seu registro, a importância relativa às despesas previstas no artigo 14 será restituída, deduzida a quantia correspondente às buscas e à prenotação.

Art. 207. No processo de dúvida, somente serão devidas custas, a serem pagas pelo interessado, quando a dúvida for julgada procedente.

Art. 208. O registro começado dentro das horas fixadas não será interrompido, salvo motivo de força maior declarado, prorrogando‑se o expediente até ser concluído.

Art. 209. Durante a prorrogação nenhuma nova apresentação será admitida, lavrando o termo de encerramento no protocolo.

Art. 210. Todos os atos serão assinados e encerrados pelo oficial, por seu substituto legal, ou por escrevente expressamente designado pelo oficial ou por seu substituto legal e autorizado pelo juiz competente ainda que os primeiros não estejam nem afastados nem impedidos.

Art. 211. Nas vias dos títulos restituídas aos apresentantes, serão declarados resumidamente, por carimbo, os atos praticados.

Isto posto, se ocorrida a DÚVIDA, o interessado poderá pedir ao Oficial que a suscite através de requerimento onde consignará a apresentação do título e sua respectiva devolução, consignando ainda a(s) razão(ões) se seu inconformismo.

O requerimento pode ter a seguinte estrutura:

Ilmo. Oficial do Registro de Imóveis da Comarca de …

Fulano….. , vem, respeitosamente à presença de V. Sa. para expor e ao final requerer o que segue:

O(a) REQUERENTE apresentou o título (carta de arrematação, Alvará Judicial, Escritura, Contrato de Compromisso de Venda e Compra, etc.) para registro em vosso cartório no dia…;

Para nossa surpresa o referido título foi devolvido por V.Sa. pelas motivos a saber:

………..

………..

Entretanto, neste ato, apresenta o(a) REQUERENTE suas razões sob o seguintes fatos e fundamentos jurídicos.

…………….

…………….

Posto isto, o(a) REQUERENTE espera ter promovido os esclarecimentos necessários. Entretanto, se ainda assim V. Sa. não se convencer, requer seja SUSCITADA DÚVIDA ao Juiz competente.

Nestes termos,

P. E. deferimento.

Data,………..

Assinatura

FLUXOGRAMA DA DÚVIDA REGISTRAL

* Não é necessária a intervenção de advogado na formalização do inconformismo do APRESENTANTE. No entanto, é recomendável, pela complexidade intrínseca da matéria.

** Quando o Oficial se recusa a levantar a DÚVIDA, estará em descumprimento de dever legal (art. 30, XIII da Lei n.º 8.935/94). Nesse caso, o APRESENTANTE poderá se dirigir diretamente ao juiz competente.

*** Pelas normas da Organização Judiciária do Estado de São Paulo, a competência é do o Juiz Titular da 1ª Vara Cível para dirimir as DÚVIDAS REGISTRAIS nas comarcas do interior. Na Capital, a competência é do Juiz Corregedor Permanente.

**** A apelação pode ser interposta pelo APRESENTANTE, Ministério Público ou o TERCEIRO PREJUDICADO que demonstre de plano, seu interesse jurídico sobre o título.