O CARF no dia 10.12.2019, negou provimento a recurso de ofício interposto no Processo Administrativo n. 16327.721015/2018-08. Discussão: versava sobre a dedutibilidade de despesas de juros sobre capital próprio (JCP) direitos econômicos mantidos após a constituição do usufruto de ações pagas por pessoa jurídica à usufrutuário. (1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção do CARF, por meio do acórdão n. 1401-004.050)

Conforme apreende-se do acórdão, acionistas de pessoa jurídica operacional, constituíram uma SOCIEDADE HOLDING capitalizando- a por meio de integralização da nua propriedade das ações da referida pessoa jurídica operacional, com reserva esses acionistas do usufruto dos direitos econômicos de referidas ações.

A pessoa jurídica operacional deliberou e pagou JCP aos usufrutuários em razão do usufruto constituído, deduzindo a referida despesa (JCP) na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, de acordo com o art. 9º da Lei n. 9249 de 26 de dezembro de 1995.

A fiscalização para o caso apresentou dois argumentos para a não dedutibilidade da despesa com o pagamento de JCP aos usufrutuários, a saber: (i) a dedutibilidade da despesa de JCP configurara benefício fiscal e por isso deveria ser interpretada de forma restritiva e, finalmente, a norma tributária somente permite a dedutibilidade dos montantes pagos aos nu-proprietários (acionistas em sentido estrito); e (ii) trata-se de planejamento tributário que
visa exclusivamente a economia da contribuição ao PIS e da COFINS sobre a receita de JCP na sócia controladora.

O contribuinte não conformado com a autuação fiscal, recorreu e argumentou que o usufruto previsto nos art. 1.390 a 1.411 do Código Civil, prevê justamente a divisão dos atributos da propriedade e, por isso à SOCIEDADE HOLDING coube a nua- propriedade e os direitos políticos decorrentes das ações da pessoa jurídica operacional, enquanto aos antigos acionistas caberia o direito aos frutos, incluindo os JCP.

E mais, não seria verdadeira a alegação de que esse planejamento visaria a obtenção de economia tributária relativa à contribuição ao PIS e à COFINS uma vez que grande parte dos acionistas anteriores, também são pessoas jurídicas, que mantiveram os direitos econômicos das ações após a constituição do usufruto, e isso por si só, afastaria a questão relativa à suposta economia tributária.

O processo administrativo foi julgado em 1ª instância acolhendo a impugnação do contribuinte e cancelou integralmente a autuação fiscal, sendo por isso, interposto recurso de ofício que foi julgado pela 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara, da 1ª Seção do CARF, cuja decisão colhida por unanimidade negou provimento ao referido
recurso e assim ementou:

“PAGAMENTO DE JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. USUFRUTUÁRIO.DEDUTIBILIDADE.
Dentro dos limites legais, é dedutível a despesa de JCP pago a usufrutuário de ações. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ABUSIVO. INOCORRÊNCIA. Não se configura planejamento tributário abusivo quando não se verifica a economia de tributos como razão única ou preponderante dos atos jurídicos realizados e a organização societária (HOLDING PATRIMONIAL) encontra-se fundada em válida razão extra tributária e sem a utilização de figuras artificiais.” grifo nosso

Entendeu o Conselheiro Carlos André Soares Nogueira que o usufruto é figura típica do direito privado, não havendo nenhuma norma tributária conferindo tratamento diverso aos rendimentos de JCP pagos ao usufrutuário.

Observou ainda que o direito de propriedade admite a divisão das faculdades em nu-proprietário e usufrutuário e “o usufruto pode recair em um ou mais bens, móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte, os frutos e utilidades.” (Art. 1.390 – CC)

Destacou também o artigo 205 do Lei 6.404/76 que estabelece: “A companhia pagará o dividendo de ações nominativas à pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária ou usufrutuária da ação.” (grifo nosso)

Portanto, a decisão reconheceu que o direito de propriedade das ações, divididos principalmente em direitos políticos e econômicos, confere parte desse direito ao usufrutuário e parte ao nu-proprietário.

Quanto a alegação de que o usufruto estaria buscando economia em relação à contribuição ao PIS e a COFINS não se confirmou, porque as acionistas também são pessoas jurídicas.

E essa decisão tem precedente onde o CARF já se posicionou nos Acórdãos a saber:

Acórdão 1401-004.212 – 1ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária
USUFRUTO. LUCROS/DIVIDENDOS. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. TRIBUTAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. DEDUTIBILIDADE DOS VALORES PAGOS.
No caso dos rendimentos pagos ou creditados a título de lucros/dividendos e de juros sobre capital próprio, o legislador tributário deixou de atribuir ao instituto do usufruto efeitos tributários específicos, o que implica remeter o intérprete aos efeitos típicos decorrentes do direito privado. São, portanto, dedutíveis os valores pagos a usufrutuários de ações a título de Juros sobre Capital Próprio (JCP)

Acórdão 2401004.568 – 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária

NULIDADE. INEXISTÊNCIA. REQUISITOS DO LANÇAMENTO. DIREITO DE DEFESA.

Preenchidos os requisitos do lançamento, não há que se falar em nulidade, nem em cerceamento do direito de defesa.

USUFRUTO. NATUREZA JURÍDICA. PARTICIPAÇÕES SOCIETÁRIAS.

O usufruto representa uma divisão das faculdades inerentes ao direito de propriedade, uma vez que o direito real sobre o objeto do usufruto é conferido a outrem, que passa a retirar os frutos e utilidades que a coisa alheia produz, sem alterar sua substância. É da essência do usufruto o aproveitamento dos rendimentos do bem pelo usufrutuário.

Com base na disciplina normativa afeta ao direito civil e societário, os valores a titulo de lucros/dividendos e de juros sobre capital próprio, pagos ou creditados como resultado de participações societárias, são rendimentos que pertencem ao usufrutuário.

USUFRUTO. LUCROS/DIVIDENDOS. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. TRIBUTAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA.
No caso dos rendimentos pagos ou creditados a título de lucros/dividendos e de juros sobre capital próprio, o legislador tributário deixou de atribuir ao instituto do usufruto efeitos tributários específicos, o que implica remeter o intérprete aos efeitos típicos decorrentes do direito privado.

As normas que estabelecem exceções à tributação ordinária devem ser interpretadas de maneira estrita, não comportando ampliação de conteúdo ou emprego de analogias, assim como inviável também a utilização pelo intérprete de exegese restritiva, para o fim de distinguir onde a lei não distingue.

JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. USUFRUTO. TRIBUTAÇÃO EXCLUSIVA NA FONTE.
Os juros pagos ou creditados a pessoa física na condição de usufrutuário de participações societárias, a título de remuneração do capital próprio, devem ser tributados exclusivamente na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento), na data do pagamento ou crédito.

LUCROS OU DIVIDENDOS. USUFRUTO. ISENÇÃO.
Os valores pagos a título de lucros ou dividendos, calculados com base nos resultados da pessoa jurídica apurados a partir do mês de janeiro de 1996, não estão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integram a base de cálculo do imposto sobre a renda da pessoa física beneficiária dos rendimentos na condição
de usufrutuária de participações societárias. Recurso Voluntário Provido.

Por tudo isso, correta parece-nos a decisão quando reconhece que o regime tributário do JCP não se altera em razão ao seu beneficiário.


Fátima Garcia.